UM VISIONÁRIO NORDESTINO - PARTE I - A PELEJA DE UM CANTADOR CONTRA OS "MEDALHÕES" DA MPB
Assim surge o nosso "herói". Nascido na cidade paraibana de Brejo do Cruz, perdeu o pai muito cedo, mas não ficou abandonado pois contava com seu AVÔHAI(avô e pai). Até que este também se foi e , mesmo assim, não abandonou o protagonista de nossa história. O velho, lá do além, soprou uma música nos ouvidos do neto, ao mesmo tempo que repetia AVÔHAI – avô e pai! O rapaz, respeitoso e obediente, guardou o presente que foi lhe dado por seu querido avô. Obviamente ele não tinha dúvidas em relação ao nome da canção, que viria a ser o seu primeiro sucesso, abrindo-lhe portas que antes teimavam em se conservarem fechadas.
Antes do sucesso iniciado com AVÔHAI, o nosso humilde herói passou por maus momentos na metrópole do Rio de Janeiro, longe de sua terra natal. Fez o caminho antes percorrido por muitos de seus conterrâneos e compartilhou o drama de um grande número de nordestinos, obrigados a abandonar sua terra, assolada pela praga da ambição humana. Culpam Deus ou a natureza por estas desgraças , mas o nosso cantador certamente sabia que homens corruptos, ambiciosos e insensíveis são os verdadeiros vilões desta história.
Na "capital cultural do país", passou fome, dormiu em bancos de praça e se prostituiu para sobreviver. Mais tarde falaria sobre este drama numa de suas mais belas músicas: "Minha profissão é suja e vulgar, quero pagamento para me deitar." A maré começa a mudar. Um produtor maravilhado pergunta se nosso cantador tinha outras músicas além de AVÔHAI. É apresentada uma fita demo com as pérolas "Chão de Giz" e "Vila do Sossego". Não demoraria para que esses três sucessos capitaneassem o primeiro álbum do nosso herói, que recebeu o título ZÉ RAMALHO.
A genialidade do compositor Zé Ramalho se confirmaria em seu antológico segundo disco, A PELEJA DO DIABO COM O DONO DO CÉU, que trazia obras que marcariam toda a sua carreira como "Beira-Mar", "Garoto de Aluguel(Taxi Boy)", "Jardim das Acácias", "Frevo Mulher" e o hino "Admirável Gado Novo". Canção que fez sucesso no seu lançamento e dezessete anos depois, quando a sua inclusão na trilha sonora de uma novela televisiva trouxe-a de volta para as rádios e para a boca do povo.
Daí para frente, o cantador conquistou cada vez mais espaço. Outros discos geniais se seguiram, mas a sua peleja estava apenas começando. Apesar de seu talento incontestável como compositor e cantor, os grandes especialistas em MPB nunca levaram nosso humilde herói muito a sério. Sua música é considerada por estes "detentores do bom gosto" como exótica, mística e cheia de imagens desconexas. Cobravam de Zé Ramalho o racionalismo e a crítica política clara e aberta. Simplesmente não compreendiam suas críticas cheias de símbolos e metáforas. Não aceitavam o seu tom profético e visionário, tão compreensível para quem veio da cultura nordestina e não negava esta cultura. O "misticismo" do povo simples do sertão nordestino felizmente continuava correndo nas veias de Zé Ramalho!
Os críticos respeitavam apenas a música que se encaixasse em determinados modelos. A vertente do samba, uma verdadeira imposição cultural do Rio de Janeiro para o resto do Brasil, era um dos modelos aceitos. Outro era a bossa nova, para os críticos símbolo de requinte musical. Além disso, os grandes medalhões da MPB como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Chico Buarque, com os seus discursos racionalistas e de crítica política, eram o grande exemplo a ser seguido. Nosso cantador não se adequava a esses cânones culturais. Sua música continuava tipicamente nordestina, forte, intensa e com personalidade própria. Ironicamente, este era o principal motivo para a sua não aceitação pelos veículos culturais do sul e sudeste. Também contribuía para isso o preconceito contra os nordestinos e a sua cultura popular. Não esquecer que nordestinos como Caetano e Gil eram aceitos porque flertavam claramente com o samba e a bossa nova.
Nosso herói atravessou os anos oitenta enfrentando o desprezo dos críticos de "bom gosto" e considerado "cult", música para uns poucos fanáticos. Apesar de ignorado pela crítica, a sua força junto a população crescia cada vez mais, inclusive no sudeste. Esta peleja não estava perdida! O envolvimento cada vez maior com as drogas, no entanto, foi um novo golpe, muito difícil de assimilar. Chegou o momento mais crítico desta história. O compositor ainda tinha a mesma força, mas o intervalo entre os álbuns começa a se tornar maior. Parecia que os dramas pessoais, somados ao desprezo e preconceito da crítica começavam a abater nosso herói. A virada para os anos noventa foi atribulada, mas esta nova década traria novos ânimos para o nosso cantador!
Essa história continua no próximo capítulo...
P.S. : No próximo episódio desta peleja, o nosso herói finalmente começa a obter reconhecimento e seu sucesso, principalmente com o público jovem, aumenta vertiginosamente! Confira também uma pequena análise dos principais álbuns deste gênio de música brasileira! Até a próxima!
Antes do sucesso iniciado com AVÔHAI, o nosso humilde herói passou por maus momentos na metrópole do Rio de Janeiro, longe de sua terra natal. Fez o caminho antes percorrido por muitos de seus conterrâneos e compartilhou o drama de um grande número de nordestinos, obrigados a abandonar sua terra, assolada pela praga da ambição humana. Culpam Deus ou a natureza por estas desgraças , mas o nosso cantador certamente sabia que homens corruptos, ambiciosos e insensíveis são os verdadeiros vilões desta história.
Na "capital cultural do país", passou fome, dormiu em bancos de praça e se prostituiu para sobreviver. Mais tarde falaria sobre este drama numa de suas mais belas músicas: "Minha profissão é suja e vulgar, quero pagamento para me deitar." A maré começa a mudar. Um produtor maravilhado pergunta se nosso cantador tinha outras músicas além de AVÔHAI. É apresentada uma fita demo com as pérolas "Chão de Giz" e "Vila do Sossego". Não demoraria para que esses três sucessos capitaneassem o primeiro álbum do nosso herói, que recebeu o título ZÉ RAMALHO.
A genialidade do compositor Zé Ramalho se confirmaria em seu antológico segundo disco, A PELEJA DO DIABO COM O DONO DO CÉU, que trazia obras que marcariam toda a sua carreira como "Beira-Mar", "Garoto de Aluguel(Taxi Boy)", "Jardim das Acácias", "Frevo Mulher" e o hino "Admirável Gado Novo". Canção que fez sucesso no seu lançamento e dezessete anos depois, quando a sua inclusão na trilha sonora de uma novela televisiva trouxe-a de volta para as rádios e para a boca do povo.
Daí para frente, o cantador conquistou cada vez mais espaço. Outros discos geniais se seguiram, mas a sua peleja estava apenas começando. Apesar de seu talento incontestável como compositor e cantor, os grandes especialistas em MPB nunca levaram nosso humilde herói muito a sério. Sua música é considerada por estes "detentores do bom gosto" como exótica, mística e cheia de imagens desconexas. Cobravam de Zé Ramalho o racionalismo e a crítica política clara e aberta. Simplesmente não compreendiam suas críticas cheias de símbolos e metáforas. Não aceitavam o seu tom profético e visionário, tão compreensível para quem veio da cultura nordestina e não negava esta cultura. O "misticismo" do povo simples do sertão nordestino felizmente continuava correndo nas veias de Zé Ramalho!
Os críticos respeitavam apenas a música que se encaixasse em determinados modelos. A vertente do samba, uma verdadeira imposição cultural do Rio de Janeiro para o resto do Brasil, era um dos modelos aceitos. Outro era a bossa nova, para os críticos símbolo de requinte musical. Além disso, os grandes medalhões da MPB como Caetano Veloso, Gilberto Gil e Chico Buarque, com os seus discursos racionalistas e de crítica política, eram o grande exemplo a ser seguido. Nosso cantador não se adequava a esses cânones culturais. Sua música continuava tipicamente nordestina, forte, intensa e com personalidade própria. Ironicamente, este era o principal motivo para a sua não aceitação pelos veículos culturais do sul e sudeste. Também contribuía para isso o preconceito contra os nordestinos e a sua cultura popular. Não esquecer que nordestinos como Caetano e Gil eram aceitos porque flertavam claramente com o samba e a bossa nova.
Nosso herói atravessou os anos oitenta enfrentando o desprezo dos críticos de "bom gosto" e considerado "cult", música para uns poucos fanáticos. Apesar de ignorado pela crítica, a sua força junto a população crescia cada vez mais, inclusive no sudeste. Esta peleja não estava perdida! O envolvimento cada vez maior com as drogas, no entanto, foi um novo golpe, muito difícil de assimilar. Chegou o momento mais crítico desta história. O compositor ainda tinha a mesma força, mas o intervalo entre os álbuns começa a se tornar maior. Parecia que os dramas pessoais, somados ao desprezo e preconceito da crítica começavam a abater nosso herói. A virada para os anos noventa foi atribulada, mas esta nova década traria novos ânimos para o nosso cantador!
Essa história continua no próximo capítulo...
P.S. : No próximo episódio desta peleja, o nosso herói finalmente começa a obter reconhecimento e seu sucesso, principalmente com o público jovem, aumenta vertiginosamente! Confira também uma pequena análise dos principais álbuns deste gênio de música brasileira! Até a próxima!