RESTINGA MUSICAL

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sábado, junho 03, 2006

DESORDEM E PROGRESSO - PARTE I




Para o público em geral, o rock não passa de "bate estacas". Isto não vale só para leigos, muitos apreciadores deste gênero consideram que o bom rock deve ser, primordialmente, marcado pela levada agressiva e a tão falada "atitude". Esse estereótipo acabou prevalecendo e, em função disso, esta música apaixonante sofre uma série de preconceitos e não é levada a sério por muitos especialistas de "bom gosto".
O rock passou a ser sinônimo de música primária, melodicamente pobre, composta e interpretada de forma medíocre. A tal "atitude" simplesmente compensaria a falta de qualidade musical e a gritaria dos cantores e vocalistas seria uma compensação para a sua falta de talento. Sem falar nas letras, sempre vistas como infantis ou sem sentido. E o pior de tudo: considera-se, no senso comum, que só exista um tipo de rock, que é sinônimo de muito barulho e pouca qualidade.
Nem entrarei no mérito das qualidades de muitas bandas que fazem o "bate estacas". Quem conferir o álbum que analisei no meu primeiro post, verá que nem todo rock agressivo é pobre, tanto em termos melódicos quanto em relação as letras. Mas o principal preconceito que quero jogar por terra é que todo rock é igual. Para quem conhece(não estarei falando nenhuma novidade), sabe-se que há muitos subgêneros do rock e que muitos deles são tão diferentes entre si, que cultivam até inimigos na própria cena rockeira.
O "tipo" de rock que mais aprecio é o chamado ROCK PROGRESSIVO. Nascido em algum momento misterioso entre os anos 60 e 70, é um estilo de rock único. A brincadeira em relação ao momento em que o progressivo surgiu faz referência à dificuldade de precisá-lo com exatidão. Reza a lenda que a música A DAY IN THE LIFE do clássico álbum "Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band", dos BEATLES, seria a gênese do rock progressivo. Muitos especialistas discordam desta versão, afirmando que a referida canção não é progressiva, mas psicodélica. Alguns entendidos sustentam que o "álbum branco"(The White Album), também dos Beatles seria a origem do progressivo. Outros afirmam que tal início teria ocorrido com os primeiros discos do PINK FLOYD. Há aqueles, entretanto, defendendo que a música dos "Floyds" é psicodélica e não progressiva. Novamente a polêmica sobre o que é progressivo e o que é psicodélico aparece!
Os nossos estimados leitores já estão percebendo a dificuldade, não apenas em determinar a origem do gênero, mas, principalmente, em defini-lo e separá-lo de outros estilos de música. Apresentarei, a seguir, algumas das características principais do rock progressivo e próprio leitor poderá formar a sua visão sobre estas polêmicas e construir o seu próprio conceito a respeito do referido gênero.
O rótulo rock progressivo é aplicado para muitas coisas diferentes, mas acredito que seja possível discernir algumas características centrais. Em primeiro lugar, é um gênero que tem por princípio quebrar conceitos tradicionais do rock. Se o rock , em sua origem, sempre foi associado à dança ou a batida que produz o movimento quase instintivo do corpo, o progressivo vem e, deliberadamente, o dissocia da dança. É uma música que sugere à reflexão e as viagens da mente. Se o rock, a princípio, era a música das melodias simples e curtas, o progressivo traz estruturas melódicas elaboradas e difíceis, em músicas que podem atingir os 43 minutos do duração!
Se as letras rockeiras sugerem a simplicidade e referências ao sexo, os "libretos" do rock progressivo trazem uma diversificação enorme de temas, onde podem figurar os assuntos como a medievalidade, ficção científica, mitologia, história, química, filosofia e por aí vai... A sofisticação das letras acompanha a sofisticação musical.
Em resumo, o rock progressivo tem como primeira característica subverter os cânones do rock. É uma música subversiva , em seu sentido mais profundo, superando a tradição para levar o rock a um nível de sofisticação e complexidade inimagináveis para os criadores deste gênero musical. Ainda que a superação do rock tradicional signifique, parodoxalmente, dialogar com as formas mais tradicionais de música, como a música clássica.
No próximo post, falaremos de outros pontos centrais do progressivo e aprofundaremos questões levantadas neste "primeiro movimento". A nossa "suite" progressiva continua!

11 Comments:

Blogger Marco said...

Ôpa! Sou o primeirão a abrir os trabalhos. Você estava ainda há pouco no Antigas Ternuras quando eu estava fazendo as minhas atualizações. Daí, fui ao Cinelândia e vim aqui ver as novidades.
Algo me diz que este meu comentário vai ser grandão, se eu não me policiar. Você está certíssimo ao dizer que rock não é só pauleira. Só um cara muito distraído acreditará que só existe um tipo de rock. Quando começou, tinha a estrutura melódica bem simples. A chamada "música de três acordes" (normalmente, Mi, Lá menor e ré). Com o crescimento da onda, a estrutura foi ficando mais complexa. E nessa parte, entra os Beatles. A afirmação de que "A Day in the Life" é o início do chamado Rock Progressivo, engraçado, nunca me passou pela cabeça. Mas, não há a menor dúvida que os Beatles são precursores de várias vertentes de rock que existe. Foram os primeiros a misturar orquestra sinfônica com a guitarrada elétrica. E o "Sgt. Pepper" é modelar nesse sentido. Era um álbum psicodélico? Dêem o rótulo que quiserem. Na verdade, foi um álbum VERDADEIRAMENTE seminal. As experiências que eles fizeram indicaram para o mundo novos caminhos a serem seguidos. O White Album é muito menos experimentação nesse sentido e muito mais rock cru. Era a intenção deles, como também o era no "Let it Be". Chamar o Pink Floyd de "psicodélico" por que? Por que o Syd Barret ficava doidão? Bull shit. A definição de rock progressivo, você a deu e foi particularmente brilhante: "Ainda que a superação do rock tradicional signifique, parodoxalmente, dialogar com as formas mais tradicionais de música, como a música clássica".
É isso! Matou a pau, Evandro! O rock progressivo nasceu do diálogo do rock com a estrutura sinfônica e complexa das peças clássicas. Ali, havia espaço para o instrumentista virtuose como existe em sonatas e sinfonias. É música para quem gosta de sonoridades e dissonâncias. A tendência do chamado álbum conceitual, que os Beatles apontaram no Sgt Pepper foi elevada às mais altas potências com os chamados progressivos. Eu admito que hoje gosto muito mais de ouvir um Rick Wakerman do que um Rolling Stones. Aliás, a introdução de instrumentos eletrônicos, como os sintetizadores, veio revolucionar o rock de forma indelével. Mas, sobre isso, imagino que você ainda vai falar, não é? Parabéns, Evandro. Seu texto está magnífico. E este seu espaço me deu a chance de discutir minhas antigas ternuras de uma forma que não ousaria fazê-lo no meu blog que é para um público mais universalista. Um forte abraço. Já estou salivando à espera do próximo post. Vou avisar ao Bruno Mutante que tem novidades aqui. (Desculpe pelo tamanho do comentário. Eu bem que sabia que ia dar nisso...)

12:37 PM  
Anonymous Anônimo said...

Grande Evandro,boa tarde!

Depois de texto tão suntuoso, inscrito no monólito da perícia,o que eu escrevesse soaria muito chinfrim.

Então,de cabeça baixa,pelo conhecimento elástico que te pertence,só me resta sair de mansinho,não sem antes agradecer a lição diferenciadora sobre os estilos narrados.

Muito excelente este primeiro capítulo.

Quem não gosta de reter as coisas sem complicações,no enxuto dos teus excertos musicais?

A pista foi dada. Você vai nos instruir na boa...

Um grande abraço pernambucano.

3:03 PM  
Blogger Evandro C. Guimarães said...

Primeiramente, Marco, agradeço por sua presença fiel neste meu novo projeto. Em segundo lugar, você não fez um comentário, você complementou as lacunas deixadas pelo meu modesto texto com sua erudição musical!
Concordo com a tua visão sobre o papel fundamental do Sgt. Peppers, que mereceria um capítulo a parte aqui no Restinga.
Não se preocupe com o tamanho dos comentários. Compartilhe sempre as suas opiniões e o seu conhecimento. Além disso,um comentário como o seu comprova que o texto agradou. E este é o objetivo! Um Grande abraço!
Grande Paulo Patriota, o teu comentário nunca seria chinfrim. A sua presença fiel neste meu novo projeto é um honra! Quanto ao meu conhecimento sobre música: infelizmente(ou felizmente, nunca se sabe!)a minha paixão é muito maior que o meu conhecimento!
De qualquer forma, um grande abraço!

4:45 PM  
Blogger Francisco Sobreira said...

Paulinho: Nunca consegui gostar de rock. Gosto mesmo é da MPB, principalmente da antiga. Tem algumas músicas que aprecio, como a de Rita Lee, mas o gênero nunca me "pegou". De todo modo, li o seu texto, como sempre bem escrito. Um abraço.

6:24 PM  
Blogger Evandro C. Guimarães said...

Esclarecendo um ponto, Francisco, o texto é de minha autoria. De qualquer forma, agradeço a sua presença e o convido a retornar futuramente. Também falarei de MPB.
Quanto ao fato de não gostar porque o ritmo não te pegou, entendo bem o que você está dizendo. Comigo acontece o mesmo com o samba. Por mais que tentem impor este gênero como símbolo do Brasil, não consigo gostar. Nem adianta tentar.
E creio que há outros gêneros, também muito brasileiros, como o chorinho e o baião que são milhares de vezes melhores que o samba!

8:55 PM  
Blogger Paulo Assumpção said...

E eu pensando que o sentido do rock era “desafiar o homem”. Hehe! Cara, você deu uma aula neste post. Que tal mudar o nome do blog para “Escola de Rock”? Mal posso esperar pela continuação do post. Só torço para que tal espera não seja tão longa quanto uma “sinfonia” de rock progressivo. Grande abraço!

8:53 PM  
Anonymous Anônimo said...

É incrível como quem tem paixão por algo escreve muito bem sobre ele. O seu texto mostra o quanto apaixonado pelo rock você é. Continue brilhante sempre!
Beijos da sua maior fã

9:08 PM  
Blogger Evandro C. Guimarães said...

Fico feliz que tenha considerado o texto esclarecedor, sócio. Mesmo com minhas muitas limitações, o objetivo é esse!
Para Simone:
Um texto sobre você,meu amor, seria ,então, o melhor de todos, pois você é a minha grande paixão!
Agradeço muito a sua presença aqui, minha linda, pois sei o quanto você abomina esta coisa de blogs e comentários. Um beijão!

3:23 PM  
Blogger Paulo Assumpção said...

O amor é lindo! :-D

1:01 PM  
Anonymous Anônimo said...

Ótimo texto Evandro! Cada vez que visito o Restinga Musical, aprendo mais! Obrigado pelas dicas! Um abraço e continue nos maravilhando com seus textos!

9:15 PM  
Blogger Evandro C. Guimarães said...

Obrigado pelos elogios, Ana. Pode continuar a visitar o Restinga. Sua presença é sempre bem-vinda!

9:59 PM  

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